Foi na festa da Consolata na Casa Regional em Lisboa, quando perguntava ao padre Darci como estava o padre Forner que este me informou da sua morte por estes dias. Ironia da vida: a dar-me a notícia foi o padre que com ele viveu tantos anos em Abrantes, na casa do Rossio ao Sul do Tejo, onde se fazia os estudos do Secundário e, depois, no Seminário do Cacém, onde fazíamos os estudos de Filosofia.
Sou um antigo seminarista da Consolata, das últimas gerações que esteve em Abrantes e no Cacém. Sou do tempo em que a casa de Abrantes estava a abarrotar e no Cacém, devido á quantidade de seminaristas, teve de se fazer camaratas no sótão. Quem frequentou o Seminário da Consolata nesses anos, na década de 80, conheceu o padre Forner, conviveu com ele, durante muitos anos. Foi o nosso formador, quer em Abrantes, quer no Cacém, onde a equipa formativa era também composta pelo Padre Darci. Estes anos foram muito intensos e recordo-os com um carinho infinito. Eramos dezenas de rapazes e a vida do Seminário identificava-nos com um projeto, um ideal. E para nós o padre Forner era o guia, o homem de barbas brancas que dirigia a nossa vida. Recordo-me dos seus silêncios, dos seus olhos esverdeados e da cadência como falava.
Gostava imenso de falar sobre a sua vida, as suas experiências de quando tinha sido missionário em Moçambique, da paixão que tinha pelas missões, pelos missionários, de África e dos mais pobres. Fomentava muito o gosto pela missão, o privilégio e a alegria que era sermos futuros missionários (recordo-me que gostava muito que os missionários que passassem por Portugal dessem os seus testemunhos – perguntava depois o que é que tínhamos achado do que tinha sido dito). Era, também, um homem discreto, muitas vezes frio connosco, quase duro na maneira como colocava os problemas, exigente quando se devia fazer o que era necessário. Recordo-me de um dia no Cacém, já noite, chamavam-no ao telefone, ter procurado por toda a parte e não o encontrando ter aceso a luz da capela onde estava em oração. Disse-lhe que o chamavam com urgência, ao que me respondeu: ”O que é urgente é eu estar aqui”.
Era um homem intransigente nos seus princípios, mas irradiava uma enorme candura e gostava imenso de Portugal. Gostava muito de nas férias ir com os seminaristas visitar as famílias. Fazia isto com muito bom grado. Depois a vida deu as voltas que tinha de dar e fui tendo notícias dele pelos missionários que vinham de Moçambique. Encontrei-o mais duas vezes na minha vida. Uma quando estava na África do Sul, no inicio dos anos 90 e já não me lembro por que razão tive de ir a Maputo. Numa manhã toquei a campainha na velha casa Regional e abriu-me a porta o padre Forner. Que alegria! Estava de passagem em Maputo onde tinha uma consulta nesse dia. Fomos a pé e relembro a enorme emoção que era estar com ele. Falou-me da sua missão no Niassa e comentei do trabalho de voluntariado que estava a fazer na África do Sul. Mais tarde, muito mais tarde, com a minha mulher visitei-o em Moçambique. Estava nos arredores de Maputo e passámos uma manhã com ele. Para mim o padre Forner foi uma das pessoas mais importantes da minha juventude, ajudou-me a formar como homem entre os 15/20 anos, um dos períodos decisivos na nossa vida.
Muitos missionários da Consolata portugueses, que hoje têm por volta dos 50 anos foram formados por ele, e muitos de nós que seguimos outros caminhos da vida, e que vivemos no Seminário nessa altura, muito devemos a este homem, á sua secreta sabedoria, á sua discreta bondade. A minha juventude passada no Seminário da Consolata marcou-me profundamente e um dia far-se-á a história do enorme contributo e da riqueza para todos nós que foram estes anos de formação. E aí a figura do padre Forner aparecerá em toda a sua dimensão.
Sei, agora, que junto de Jesus, de Maria, do Beato Allamano, dos outros missionários da Consolata já falecidos ele continuará a rezar por nós. Obrigado padre Forner, falarei sempre de si aos meus filhos.
Jorge Almeida