Padre Luís Ferraz: Missionário simples e humilde

“É bom estar com os irmãos, é bom estar com Deus!” Foi uma das últimas frases do padre Luís Ferraz, antes de sair do hospital de São João – Porto, para a comunidade dos Missionários da Consolata em Fátima.

 

Se olharmos para as fotografias do padre Luís, vemos uma pessoa, serena, tranquila, simples, humilde. E de facto, era assim. Homem simples e humilde…. Assim muitos missionários da Consolata e amigos descreveram o padre Ferraz.

 

Certamente, o Evangelho das Bem-aventuranças iluminou a vida do nosso querido padre Luís. “Bem-aventurados os humildes (os mansos), porque possuirão a terra”. O manso “defende a sua paz, defende a sua relação com Deus, defende os seus dons, os dons de Deus, preservando a misericórdia, a fraternidade, a confiança, a esperança. Porque as pessoas mansas são pessoas misericordiosas, fraternas, confiantes e esperançosas,” declarou o Papa Francisco. O Beato José Allamano dizia que: “Nenhuma virtude por mais esplêndida que seja, consegue ser sólida, se não for acompanhada pela humildade”. Santo Agostinho, interrogado certa vez sobre qual fosse a primeira virtude, respondeu: “a primeira é a humildade, a segunda é a humildade e a terceira é a humildade”. Afirmou ainda, o Beato José Allamano: “A virtude da humildade é tão necessária aos missionários que, sem ela, não se pode fazer nada de bom”. O padre Luís, como um bom filho de Allamano, empenhou-se na humildade.

 

Vida dedicada à missão

O padre Luís teve uma história de vida apostólica missionária longa e riquíssima, 66 anos de Profissão Religiosa e 61 anos de Sacerdócio. Partilhou, uma vez, sobre a entrada no seminário que: “Eu nem sabia nada sobre missionários ou religiosos, mas iria para qualquer lado onde pudesse (concretizar o meu sonho de) ser padre… Insisti em querer ir a qualquer lado onde pudesse de facto ser padre. E assim foi, o pároco é que me levou aos Missionários da Consolata… Eu aceitei tudo e fiquei muito feliz”.

 

O padre Luís exerceu o seu serviço missionário sobretudo em Moçambique durante 49 anos, alguns dos quais foram vividos durante a guerra. De facto, quando chegou a Moçambique, a guerra já tinha começado (em 1964). E o período que se seguiu imediatamente à independência e à guerra civil foi muito difícil: “Recordo-me bem de ir comprar um bocadinho de sabão, um bocadinho de arroz, um punhado de açúcar… Essa realidade era muito complicada para o povo, e para nós,” referiu.

 

Conseguiu viver nesse ambiente difícil na capital, e podemos dizer que o seu temperamento calmo ajudou nas perturbações desagradáveis. O padre Luís mesmo afirmou: “Eu fui sempre bastante pacífico e também um pouco passivo, isto é, enfrento as coisas com uma certa calma, e talvez por ser algo retraído, nunca tive problemas com ninguém.” Acrescentou ainda, “nunca fui destinado para outro lado e também nunca pedi para sair, por isso fui ficando…”

 

O primero sacerdote missionário da Consolata português, padre Manuel Carreira, falecido em 2012, apresentou o padre Luís, na revista Fátima Missionária, de novembro de 2006, deste modo:

“Discreto em tudo, no andar, no falar e até no alimentar-se, conviveu connosco em Fátima algumas semanas (durante as suas férias) e edificou-nos com a naturalidade com que falava da missão”. Interrogado ainda pela revista Fátima Missionária, deixou algumas palavras a respeito da sua nova partida para as missões, depois das férias do ano 2006. “Tenho 74 anos já feitos e muita gente me interroga porque regresso a Moçambique. Respondo-lhes que a missão não olha à idade, mas ao que eu ainda posso dar de mim próprio. Ninguém me exigirá que faça coisas superiores às minhas forças, mas que dê o que puder, sobretudo o meu testemunho. O simples facto de estar num país estrangeiro, em nome da Igreja e de um Instituto missionário, já significa ‘missão’. Mas eu espero não ser apenas uma presença passiva, mas sim uma presença viva que anima a comunidade local”. Esta partilha mostra a grande paixão que o padre Luís tinha pela missão.

 

Testemunho

Eu, pessoalmente, encontrei o padre Luís, pela primeira vez, em Moçambique, quando cheguei a Maputo, em 2007, com outros colegas seminaristas do Quénia, Tanzânia, Uganda e República do Congo. Fomos destinados ao seminário filosófico da Consolata da Matola, para aprender a língua portuguesa, e depois continuar com o nosso caminho formativo…. Chegámos à Matola poucos dias depois da morte do Reitor do seminário padre Joseph Rurunga. O padre Luís era o ecónomo da casa, e ficando sozinho com os seminaristas, teve que fazer tudo. Acolheu-nos bem, com a sua simplicidade. Não falava a língua inglesa nem outras línguas que nós falávamos, mas sempre fez muitos esforços para nos entender, e perceber aquilo que comunicávamos. Foi muito paciente connosco, tentando responder aos nossos pedidos – que eram muitos, porque não sabíamos dizer nada em português. As primeiras semanas eram difíceis para ele e para nós, mas esteve sempre presente e calmo. Nos momentos de festas, e quando alguém fazia anos, gritávamos, “padre Luís, festa!” – poucas palavras que conhecíamos da língua de Camões. E padre Luís, sem fazer muitas perguntas, corria para fazer as compras, para que pudéssemos celebrar. E não podia faltar a 2M – cerveja moçambicana, também conhecida como “À Nossa Maneira”.

 

Padre Luís, agora é a tua festa, na presença dos Anjos. Obrigado Luisinho pelo teu testemunho de vida e pela tua entrega à missão.

Padre Bernard Obiero, IMC