1 Sam 16, 1-13: Ef 5, 8-14; Jo 9, 1-41
“Eu sou a luz do mundo, diz o Senhor: Quem me segue terá a luz da vida”. Se a Páscoa é a festa da iluminação, a Quaresma consiste num esforço de ver e acreditar. No batismo, com o lodo frágil da sua humanidade, igual à nossa, Cristo ungiu-nos e tirou-nos das trevas para nos fazer participantes da sua luz e santidade.
A luz é um dos símbolos mais belos da Sagrada Escritura. Não é por acaso que a luz foi a primeira a ser criada para pôr termo às trevas. Pelo batismo, o Senhor ungiu os nossos olhos e tornou-nos filhos da luz, dando-nos a missão de operar com gestos de justiça e bondade que rasguem as trevas do nosso mundo. “Se tirares do meio de ti a opressão, gestos de ameaça e palavras ofensivas, se deres do teu pão ao faminto, a tua luz brilhará na escuridão e a tua noite será como o meio-dia”.
Fomos consagrados para levar ao mundo a luz que esclarece: iluminados para iluminar. É a raiz do nosso ser missionários. Deixar-nos iluminar para depois iluminarmos os outros. “Vivei como filhos da luz, porque o fruto da luz é a bondade, a justiça e a verdade. Não tomeis parte nas obras das trevas. Procurai sempre o que mais agrada ao Senhor”. Batizados em Cristo adquirimos o seu olhar sobre o mundo e sobre cada criatura que Ele aí colocou. Ter o seu olhar quer dizer ter olhos de compaixão e de misericórdia. Quer dizer ver por dentro, ver com o coração.
Lê-se tantas vezes no Evangelho: “Jesus, ao ver as multidões, encheu-se de compaixão por elas”. Tal como olhou para o cego de nascença do Evangelho deste Domingo. O seu olhar penetra no mais íntimo da pessoa humana e reveste-a de amor e misericórdia.
Aos pobres não é suficiente dar pão. “Quem não dá Deus dá demasiado pouco”, dirá a Madre Teresa de Calcutá. Antes da esmola ou da solidariedade, antes de uma intervenção no campo da cooperação, antes das leis que modifiquem desequilíbrios económicos – coisas aliás importantes e necessárias – antes de tudo isso, é de um “olhar” que todos precisamos. Necessitamos de adquirir o mesmo olhar de Jesus.
Ver com os olhos de Cristo – Quem se “compadece” toma conta da pessoa no seu todo, e não só de uma ou de outra necessidade. É preciso que o nosso “olhar” sobre as pessoas seja idêntico ao olhar de Cristo. Só um olhar assim que foca o homem todo – com a sua sede de Deus não menos ardente do que a sede de água limpa, com a sua fome de sentido não menos importante do que a fome de pão – só um olhar assim consegue aproximar-se das pessoas para as escutar e compreender. As obras de misericórdia expostas no catecismo não são só materiais, são também espirituais, e a Igreja missionária ao longo dos séculos não se limitou a curar as chagas purulentas do corpo, mas também as feridas invisíveis do coração.
“Só se vê bem com o coração” – Precisamos muito de olhar para o mundo com o nosso coração. Já o dizia o Principezinho que “só se vê bem com o coração: o essencial é invisível para os olhos”. Às vezes precisamos de fechar os olhos para ver melhor. Olhamos para uma árvore e não vemos as raízes, mas é por elas que a planta vive. Ver com o coração. Amar a Deus de todo o coração. Amar as pessoas de todo o coração. Rezar com o coração. Falar a Deus com o coração. Adorar com o coração. Trabalhar seja onde for, mas sempre com coração… Não somos de plástico. Precisamos de pôr o coração em tudo aquilo que fazemos.
Que o Senhor ilumine os nossos olhos e nos dê o seu olhar sobre as pessoas e sobre o mundo.
Darci Vilarinho