8 de junho de 2023
Deut 8, 2-16A; 1Cor 10, 16-17; Jo 6, 51-58
“Quem comer deste pão viverá para sempre”
1. A Sagrada Escritura apresenta a Eucaristia como alimento. O sentido de banquete do peregrino, próprio da Eucaristia, encontra-se sobretudo na figura do maná, o alimento milagroso que Deus enviou ao povo hebreu durante quarenta anos sustentando-o na sua travessia pelo deserto. A este maná se referiu expressamente Cristo ao falar do pão da vida descido do Céu
Esta índole da Eucaristia como alimento do peregrino é recolhida, de maneira poética, na sequência Lauda Sion da solenidade do Corpo de Deus, que celebramos neste dia: «Ecce panis angelorum, factus cibus viatorum» (eis o pão dos anjos feito alimento dos viandantes) e é expressa nos textos litúrgicos da celebração eucarística.
O pão da Eucaristia é a força dos fracos: «O seu Corpo, por nós imolado, é alimento que nos fortalece» (Prefácio da Eucaristia I), é consolação dos enfermos, é viático dos moribundos, pois Cristo «faz-se comida e bebida espiritual para a nossa viagem ao encontro da Páscoa eterna» (Prefácio da Eucaristia III); é o alimento substancial que sustenta tantos cristãos que têm de dar testemunho a favor da verdade do Evangelho, em diversos ambientes.
2. «Quem de verdade Me come viverá por Mim», diz-nos Jesus no Evangelho deste dia, para insistir na necessidade que temos de nos alimentar d’Ele, que é o pão descido do Céu. A participação neste sagrado Banquete edifica-nos como Corpo místico de Cristo. Jesus Eucaristia é, pois, o centro da vida da Igreja.
“Viverá por Mim”, diz Jesus. Pela Eucaristia somos de facto cristificados. A Igreja tem na Eucaristia o alimento que a sustenta e transforma interiormente. Já são Leão Magno (séc. IV) dizia: «outra coisa não faz a participação no corpo e sangue de Cristo, do que transformar-nos naquilo que recebemos». Somos assimilados por Cristo, somos transformados em homens novos, unidos intimamente a Ele, que é a cabeça do Corpo Místico.
Confirma-o S. Tomás de Aquino: “O efeito próprio da eucaristia é a transformação do homem em Deus”, isto é, a sua divinização. Portanto, recebendo o pão consagrado, não o transformamos em nós, como acontece com o pão de cada dia, mas pela Eucaristia somos transformados em Jesus, somos divinizados.
3. A Eucaristia une entre si os cristãos… Se todos nos alimentamos do mesmo pão, fazemos parte todos do mesmo Corpo. É a eucaristia que faz a Igreja. É mistério de comunhão. Gera a comunidade.
E se a Eucaristia nos transforma em Cristo, somos outro Cristo.
Como é que devemos então comportar-nos? Como o próprio Cristo: ter os seus sentimentos, o seu modo de pensar, o seu modo de agir, os seus critérios deverão ser os nossos… E aqui temos diante de nós um campo imenso… É todo o Evangelho que devemos viver, expresso no sermão das Bem-aventuranças e sobretudo no mandamento novo do amor que, aliás, está profundamente ligado com a Eucaristia.
4. A Eucaristia é semente, é penhor de ressurreição: “Quem comer deste pão viverá para sempre”, disse Jesus. Temos a garantia de contemplarmos Jesus Ressuscitado na vida sem fim. E se participamos na morte e ressurreição daquele que deu a vida por nós, também nós deveremos estar dispostos a dar a vida uns pelos outros… A eucaristia é um teste à nossa vida cristã, â nossa caridade.
5. Podemos dizer mais. A Eucaristia tem o poder de transformar não só o nosso corpo físico, não só o corpo que é a Igreja, mas todo o corpo social. Se a humanidade em geral, por falta de fé neste sacramento, não está em contacto direto com a Eucaristia, não deixa de estar continuamente em contacto direto com os cristãos. Deveremos ser nós a eucaristia da sociedade. Amando os outros damos-lhe Jesus. Deixando-nos “comer” de um certo modo pelos outros, tornamo-nos eucaristia dos outros que, “comendo-nos” a nós, se alimentam de Jesus. Cada um deve aprender a dizer a própria missa na vida quotidiana. Ser eucaristia para os outros, é uma enorme missão de cada cristão.
6. Em síntese, o rito que diariamente celebramos deve ser a expressão da nossa vida. Que fazemos da Eucaristia de cada dia, se depois não nos empenhamos a dar a vida uns pelos outros? Somos chamados a viver com verdade e sinceridade as nossas celebrações. Não há nenhum outro mistério da nossa fé que tenha tanto a ver com a nossa coerência de vida. Para que ela produza em plenitude os esperados frutos de comunhão e de renovação, não podem faltar na nossa vida o perdão e o amor recíprocos. Jesus advertiu-nos que antes de apresentar a nossa oferta ao altar, devemos reconciliar-nos com os nossos irmãos (Mt 5, 23). Não se pode celebrar o sacramento da unidade permanecendo reciprocamente indiferentes. Pois é principalmente na comunhão com Jesus Eucaristia que nós conseguimos a capacidade de amar e de perdoar. Assim seja.
Darci Vilarinho